sábado, março 26, 2022

Transporte de vinte e nove noivas acabadas de contrair seu Matrimónio em Malema 1974.




Em Malema Moçambique a tropa, quando era necessário, dar continuidade a missões!. 

»Num belo domingo depois do pequeno almoço eu descansando na minha cama, fui surpreendido pelo condutor António Manuel Coelho Ferreira, com ordens do comandante de Companhia, ao entrar na minha caserna me ordenou, para eu vestir o meu camuflado, pegar na minha arma, levantar uma ração  (ração de combate), que seria o meu almoço nesse dia de domingo. Como era necessário dar a continuidade, à missão! Rumamos a Sul seguindo uma picada que iniciando na orla da mata, serpentava pelo capim, e rolamos durante algum tempo o suficiente para se perder de vista, as cumieiras dos edifícios de Malema. À nossa frente, continuava a picada, pintada de amarelo, com capim seco matizado, aqui e ali de tufos verdes, da folhagem perene de ervas estranhas sucediam-se em desenhos, irregulares entre cortada, de forma desordenada, por grupos de árvores de pequeno porte escurecido, pelo fumo das queimadas que ciclicamente assolavam a mata e depositavam, no solo, um pó escuro e fino. Pouco mais de termos percorridos vários quilómetros, sob as ferroadas da picada e de um sol impiedoso , foi o suficiente para esgotar toda a resistência, que em esforço procurava a aquela capela pintada de branco, onde se encontrava as noivas, recém casadas, vestidas de branco. O meu camarada encostou a viatura, junto ao adro da capela, eu como chefe de viatura, organizei o transporte, o tempo de marcha foi ficando cada vês mais curto, enquanto se alongava as paragens, e se mitigava a sede, com pequenos golos, cuidando de fazer durar, o escasso litro de água, transportando no cantil. Sabendo-se que não haveria água no percurso, racionava-se a que se trazia. Já de muitos quilómetros percorridos chegou a hora do almoço, o meu camarada condutor parou a mercedes no meio da picada, saltamos  da viatura, e refugiámos-mos à sombra de uma árvore, frondosa, a almoçar enquanto aquelas noivas recém casadas se encontravam ao calor, em cima da carroçaria, parecia olhar-nos de soslaio, como se não compreendesse a fraca resistência, da tropa. Foi com alivio que lá para o fim da tarde, se avistaram ao longe, o aldeamento com cerca de uma vintena, de palhotas toscamente construídas, e espalhadas desordenadamente, num recanto da povoação. À nossa chegada, se encontrava um homem, velho de cabelo encarapinhado brancos, era o senhor régulo o chefe da povoação, a darmos as boas vindas. Depois do desembarque daquelas jovens, recém casadas, o batuque com o seu tum-tum-tum, e cada grupo falava o seu próprio dialeto falado, senão por todos, pelo menos pela maioria. isto significava que entender aquela gente, implicava ser-se poliglota, em dialetos das terras do fim do mundo, isso era impossível. E como muito deles pouco falavam, português, a comunicação tornava-se, complicada. Para já falar fluentemente o português, e conseguir fazer a retroversão, para a linguagem, daquelas gentes não era pouca coisa. nem de somenos importância. Fomos bem recebidos aquele povo nunca tinham visto um homem vestido de farda, com o seu camuflado, e armado mantendo ordem, naquele  aldeamento. O baile tinha começado, vi aquelas noivas vestidas de branco dançando com seus recém maridos, acabados de contrair o matrimónio,   vejo um grupo de pessoas tratando dos alimentos, em fornos improvisados em chapa, assando frangos, e carne. Fomos convidados a participar na boda, e verdade que me senti verdadeiramente compensado, dos tratos existentes que nos convidaram, a comer aquela carne gostosa, caprichosamente, recortada. Bebi bom vinho, e cerveja  fresca, era isto que eu precisava, pois eu cumpri plenamente  a minha função. O tempo passou, e agora era tempo de regressar ao nosso aquartelamento,  o primeiro  comentário do senhor régulo que percebia, e falava um pouco português nos agradeceu, e nos desejou uma boa viagem de regresso.  Aquele povo nos aplaudiu o condutor colocou a viatura em andamento, enquanto o ar completamente limpo, apenas era irrespirável pela intensidade, do calor. A viagem tem uma história os mais de trinta quilómetros já percorridos, que separavam do aldeamento, o destino prometia, uma viagem longa e monótona. recordo que a metade do percurso, definido por uma estrada ambulante, sempre a direito encontramos um casal de negros, pedindo boleia pois já era habitual. O meu camarada condutor Ferreira meteu freio aos travões, parou a viatura e ordenou para subirem para a carroçaria, embora o andamento atingisse, por vezes, uma velocidade significativa. A viagem não deixou de ser, monótona e cansativa, através de um território imenso, com paisagens a perder de vista e cheias de coisa nenhuma, cenário que nos acompanhou até palhota do casal que transportamos, na retaguarda da viatura. Ali paramos fomos convidados pelo casal que foi em direção de um dos galinheiros, e nos ofereceram um bom galo a cada um de nós. Por ali seguimos em roda livre, pois acabávamos de ganhar o nosso jantar. O meu camarada Ferreira, em jeito de brincadeira, me dizia que a mercedes estava a ficar sem combustível. Mas com todas as dificuldades, conseguimos chegar ao aquartelamento.

Texto de Bernardino Peixoto Soldado Corneteiro 017516/72.                                                  

quinta-feira, março 24, 2022

Operação à base avançada da Mepoche 29 de janeiro de 1973:




 Veio à memória quando no Lunho foi realizada uma operação a nível de Companhia, à base avançada da Mepoche, as dificuldades em definir um rumo num terreno, demasiadamente plano e sem pontos de referência. tirando uma exceção uma aqui outra acolá, a paisagem mais parecia, uma mesma imagem sucessivamente repetida, num cenário virgem e selvagem que talvez nunca tivesse, até então, visto gente. A imagem a indicar o caminho, ilustrava bem a dificuldade de, definir um rumo embora para nós que fazíamos parte da operação, parecesse coisa singela. Se bem me lembro nunca antes a tropa, chegara àquele local, o que penso eu, determinou que o nosso inimigo, de então tenha decidido ali instalar uma base. era longe, e não havia caminhos que nos lá levasse. Chegar às suas imediações, implicou um longo percurso, a corta mato, seguindo as indicações do nosso Comandante de Companhia António Cardoso Capitão Miliciano, que mais parecia orientar-se por telepatia. Aventura que foi uma grande viagem além da operação ser de oito dias, até que avistamos o rio da Mepoche, onde foi feita uma pausa para a reunião dos oficiais, e sargentos, afim de escolher um grupo de onze militares que iam fazer o assalto à dita base. aqueles que foram escolhido como eu! não conhecíamos, os andanhos daquela mata, incaracterísticas. Quando nos foi ordenado pelo comandante, seguimos um trilho que ao lado se encontrava cultivada uma machamba de milho, e ao cimo uma palhota onde se encontrava, um guerrilheiro da Frelimo, de vigia fugiu com a sua arma em direção à base alertar os camaradas a nossa presença. O episódio se passou quando chegamos ao cimo do trilho, ali vi uma base constituída por cerca de trinta palhotas, fizemos o cerco fomos recebidos com fogo das armas ligeiras, e automáticas, fui visto por um dos guerrilheiros, que me apontou a sua arma, eu me encontrava protegido por uma árvore o rebelde disparou uma rajada de tiros, os projéteis  ficaram cravados, na mesma árvore que me protegia. De imediato eles se puseram em fuga, deixaram para trás todos os seus pertences que nós com Ronso da picada chegamos fogo a todas as palhotas, Em pouco tempo estávamos a ser bombardeados pelo morteiro 82. A destruição da base foi total em seguida  abandonamos o local ao descer o trilho, senti o estoiro das granadas a estoirar perto de mim, e os estilhaços a perfurar as árvores. Continuei a descer aquele trilho, como se tivesse de memória cada árvore, não obstante tudo parecesse igual, numa paisagem imutável e agreste. Simplesmente recordo aquele dia 29 de janeiro de 1973,inicilamente sobre a ameaça do morteiro 82 ou de uma emboscada, fomos ter com o  grupo que ficaram junto ao rio da Mepoche. A operação terminou ali, foi-nos ordenado que abandonássemos o local, continuamos a calcorrear aquelas matas, a poucos quilómetros fizemos uma pausa para o  merecido almoço (ração de combate) deixamos para traz um rasto de destruição, depois de termos ingerido a refeição, fomos surpreendidos por alguns guerrilheiros da Frelimo, que nos seguiram, aos primeiros tiros, se puseram em fuga. Naquele  momento seguimos marcha, em direção ao nosso aquartelamento, ao passar por várias árvores, algum camarada sem querer, mexeu numa das árvores, fomos atacados por um enorme enxame de abelhas, onde foi fortemente picado o soldado António Varandas, que foi evacuado ali no mato por um helicóptero,   para  hospital do Setor "A" em Vila Cabral. Pensou-se o pior, mas tudo correu normalmente, não fora mais um problema que ninguém esperava,  ninguém se apercebeu e tão pouco fês qualquer  sinal para parar, inicialmente se pensou que tudo estava normal, o   soldado Rogério Sampaio, esqueceu-se do lugar onde estávamos, provavelmente se enganou nos trilhos, deixou de nos ver, como se fora algo que mais à frente nos encontrava, deixara para traz simplesmente, foi numa outra direção ficou perdido naquele isolamento no meio do mato e capim, passou aquela  noite escura, só à mercê dos animais selvagens e pelos guerrilheiros da Frelimo, pelo tempo e pelas intempéries.  Quando chegamos ao aquartelamento do Lunho, foi feita a formatura de a praxe, foi quando demos pela falta desse nosso camarada, que ficou perdido no mato. No dia seguinte um pequeno avião sobrevoou a zona, e não foi possível detetar a sua presença. O segundo grupo de combate saiu ao seu encontro, fomos encontrar ao fundo da ponte do Lunho, acompanhado por um amigo de quatro patas, que nunca o abandonou. Não me admiro nada, que para o meu camarada Rogério Sampaio, aquela noite que lhe trás à memória, recordações de um advento de guerra nunca se apagará. Gastou-se rapidamente o mês e os meses que restavam de 1973,o segundo Natal disfarçado no meio de um calor de derreter, seguindo-se os dias, um a um lento calvário sem fim à vista. Ao décimo quinto mês deixei de pensar no assunto, e só alguns se entretinham, a contar o tempo, esse continuaria arrastar-se pastoso, rotineiro, monocórdico e entediante,  apenas pelas visitas, semanais do "avião" sempre desejado animação materializada trazendo o sagrado correio condicionado dentro daquele pequeno saco. fui ocupando o tempo com rotinas, já mais que rotinadas, com aquela certeza que acompanhava com uma cerveja laurentina, para mitigar a sede e amenizar o calor já que a água era férrea e não sabia bem e a cerveja não era cara. Identificava os cheiros fortes e característicos, do aquartelamento, já conhecia a cor da musica desordenada, das grossas pingas de chuva embatendo com violência, no telhado de zinco da minha caserna. Habituei-me às sistemáticas mudanças de paisagens, que as chuvas diluvianas, pintavam de múltiplos tons de verde para de seguida iam sendo teimosamente, repintadas de ocre com pinceladas de negro, acinzentado das queimadas, à medida que a época seca se instalava. 

Texto de Bernardino Peixoto Soldado Corneteiro 017516/72.                                     

segunda-feira, março 21, 2022

Aquartelamento do Lunho Moçambique 1972


Dia 19 de novembro de 1972 cheguei ao Lunho, Com a Companhia de Caçadores 41  41 os Gaviões: 

Esta guarnição Militar, ficou sediada num aquartelamento mais isolado, a Noroeste do Niassa; O seu ambiente era só mato, e os montes que vigiavam de perto e de longe, montes mais pequenos como Lijombos, e grandes como o Chissindo. Para os que estavam do lado de cá! O Lunho ficava lá para o fim do mundo, mas para mim que estava lá! Aqueles 17 quilómetros que me separava, do aquartelamento e da povoação mais próxima, Nova Coimbra eram intermináveis. Era necessário todo o carregamento de frescos, que chegava num pequeno avião, e tinha de dar para toda a semana, 200 quilos de carne, fruta, o correio, e pouco mais. Cada quilómetro teve uma história, era uma emboscada, uma mina que era detetada, e era levantada, era uma viatura que atascava, e obrigava horas e horas, de trabalho angustiante, eram patrulhamentos. Havia sangue, suor, e esforço dos que iam para as operações, dos que iam fazer a proteção a uma coluna, dos que iam compor o itinerário, dos que iam carregar às costas, os reabastecimentos que não chegava lá de avião, porque a pista de aviação durante as chuvas, se alagava,  e o nome do Lunho metia muito respeito. Impressionava os que não  estavam lá, porque os que estavam! estavam acostumados e jogavam a apreensão de cada dia com a naturalidade de que todos os dias, saiam de casa para o emprego. Era o aquartelamento, e todo o seu horizonte era a vegetação rasteira, e plana, na maior parte da vista ao seu redor, e para o outro lado, umas grandes montanhas, a subida para a Miandica. Claro que não havia lá mais nada, não havia viva alma à sua volta! As casernas de material pré-fabricadas, em chapas de zinco, disseminadas mais ou menos   irregular desordenadamente. Para quem não soube, o Lunho ficava lá para o fim do mundo! aquelas picadas cheiravam a trotil, a destruição, e a morte. Nós soldados isolados, perdidos no meio do mato e capim passou a ser o centro daquele aquartelamento onde só reinava o terror e o medo

Texto de Bernardino Peixoto Soldado Corneteiro 017516/72.                          

sexta-feira, março 18, 2022

Antigos Combatentes do Ultramar:

A guerra do Ultramar para uns! guerra Colonial para outros! teve inicio no ano de 1961 perfazendo  atualmente sessenta anos. Por outro lado, decorridos que  estão quarenta e nove anos, após o 25 de Abril de 1974,os combatentes do Ultramar, são hoje confrontados, com um sentimento de abandono, e de desprezo, por uma Pátria madrasta. Certamente que o Senhor Comandante Supremo das Forças armadas, sabe que hoje existe, um sentimento de revolta e descontentamento, generalizado em todos os combatentes do Ultramar. Sentimento esse  que vai ao ponto, extremo de vários heróis, antigos combatentes entregar as suas cruzes de guerra e medalhas, ao Senhor. Fomos além mar, onde a pátria foi, lutamos com um clamor, imortal de mar, em mar, de rio, em rio, de serra, em serra, sempre em prol de uma Pátria que julguei ser a nossa, porque foi a nossa Pátria que nos pediu, para lutar por ela. hoje essa mesma Pátria olha para nós combatentes, como inúteis, como traidores, ou até mesmo como mercenários.


Texto de Bernardino Peixoto  Soldado Corneteiro 017516/72.              

Chegada da Companhia de Caçadores 41 41 os Gaviões a Metangula:



 

sábado, março 05, 2022

Posto de Sentinela no Lunho Moçambique 15 Fevereiro de 1973:

O posto de sentinela estava plantado, entre a cozinha, e o depósito de géneros, era um espaço com evidente aspeto de vigia. È verdade foi ocupado por mim, depois de um curto espaço de tempo, que durou a minha refeição. Ali se encontrava um dos meus camaradas que eu iria render, pelas 14 horas, este posto de vigia era desprovido com uma tosca estrutura, de barrotes em madeira, coberto com uma chapa ondulada, retorcida e ferrugenta. Levei comigo uma revista (crónica feminina) saquei de um cigarro "FN" manifestava de várias formas, enquanto lia segurava o cigarro espremendo fortemente entre os dedos, esquecia que o tinha na boca, deixava o morrão de cinza alongar-se, até cair naturalmente onde quer que fosse, ou sacudia-o violentamente quando a proximidade de incandescência, me queimava os dedos. Parei um pouco a leitura, neste posto de sentinela abraçava um curso de água que se transformou num pântano, a sua extensão se alongava a perder de vista. O perigo se passou comigo, naquele posto de vigia, comparando com a minha total ignorância ao ver um guerrilheiro da Frelimo, seguindo pela pista de aviação com a sua arma, e seus pertences, eu encurralei o guerrilheiro num gesto de defesa, aqui transcrevo a discrição, do Samuel que melhor que ninguém conhecia aquelas matas. O guerrilheiro quase passava despercebido, não fora duas ou três situações extremas, que me marcaram e o facto de eu ter os olhos arregalados, quando lia a revista. Os guerrilheiros da Frelimo tinham as suas bases implantadas muito perto do aquartelamento do Lunho!! No silêncio  as tonturas que me assolavam, deram as suas máximas mais recordadas. O meu turno terminava, como delicadamente se culpasse o meu desconforto, balbuciou num lamento quase suplicante. Conduzi o guerrilheiro ao meu Comandante de Companhia António Cardoso Capitão Miliciano o qual verifiquei que transportava consigo a sua arma, uma saca em pano com uns simples miseráveis grãos de arroz cru, e uma colher de pau. Depois da minha rendição daquele posto de vigia, sem nostalgia ou satisfações, dirigi-me à minha caserna, coloquei a minha arma, vime de novo na parada  onde, se encontrava aquele negro, sentado rodeado dos meus camaradas. Olhei com muita tristeza, ao ver um inocente como eu lutando por uma guerra que não fazia sentido. Tenho na minha memória que o nosso Cabo quarteleiro, Serra Henriques lhe preparou uma cama, com lençóis e cobertores, e como paga do reconhecimento da amizade, das nossas tropas, e o carinho, o guerrilheiro lhe ofereceu como prenda a colher de pau. Foi enviado para Vila Cabral, pouco tempo  depois, o encontrei novamente no nosso aquartelamento, aquele homem me abraçou, e desabafou comigo que esteve ao fundo da pista de aviação, deitado com a sua arma, apontada em minha direção, se o rebelde prime o gatilho da sua arma, era mais um soldado da Metrópole que tombava na flor da idade. Isto me aconteceu uma única vês, que deixou trauma, em não desaparecer apenas recordações de tão marcantes, não consigo apagar e já lá vão quarenta e nove anos. 
 Texto de Bernardino Peixoto Sodado Corneteiro 017516/72.              
 

Convívio da Companhia de Caçadores 4141 os Gaviões na Marinha Grande Outubro 2013:


 

sexta-feira, março 04, 2022

"A MINHA EVACUAÇÃO PARA O HOSPITAL DE VILA CABRAL" MÊS DE SETEMBRO DE 1973 :



No Lunho os homens formados à pressa, escolhidos com base em critérios, que nunca cheguei a perceber. Creio que alguma vez ido além de estrelar um ovo, a verdade é que a tropa transformava, pedreiros, carpinteiros, jardineiros e afins em cozinheiros temporários que, após cumprido o serviço militar, voltavam às suas atividades iniciais. Se transportar tudo isto para a realidade, no Lunho as coisas  pioravam. A cozinha não ajudava, o combustível era a lenha colhida na mata, os tachos eram negros e grandes, e o calor tomava a tarefa do cozinheiro e seus auxiliares, um martírio. Agravar tudo isto, os ingredientes escasseavam, a ração era parca e nem ingredientes haviam para confecionar uma sopa dita. Na verdade a variedade do rancho, oscilava entre massa com carne, e a carne com massa substituída de tempos, em tempos por feijões. Bifes, nem velos e o peixe era indesejado. de vez em quando, lá vinham umas salsichas, uma feijoada com uma ou outra rodela de chouriço barato, umas ervilhas enlatadas e pouco mais. Ah! havia ainda a dobradinha. O ingrediente chegava seco desidratado, em forma de pequenos pedaços parecidos com flocos que inchavam quando posto de molho. Dobradinha com feijão, amamentada com uma colherada de arroz, era assim um dos petiscos que primita desenjoar da massa, mas que não nos livrava dos feijões, que engrossavam o molho com aspeto amarelado, de cola liquida condimentada com chouriço, estrategicamente misturado para dar gosto e onde os mais gulosos ensopavam o pão. Exigir dotes de prestigiado, tanto mais que os ingredientes não estavam disponíveis. No Lunho não havia nem de perto nem de longe, uma  tosca  tasca ambulante improvisada,   a não ser uma pequena cantina, dentro do aquartelamento. O cantineiro (ROCHA) que se encontrava atrás do balcão, vendia  as bebidas com carimbo   de isenção, mas eu pagava  a preço corrente. A cantina era explorada  pelo   nosso 1.º Sargento Bizarro, que vendia o tabaco, a cerveja, outras bebidas,  e pouco mais. O reabastecimento era feito por coluna, os frescos eram transportados por um pequeno avião que nos visitava duas vezes por semana. O vinho era de péssima qualidade. A alimentação no Lunho era muito pobre, talvez foi a razão que eu tive de baixar à enfermaria com o paludismo misturado com fraqueza, o meu estado se agravava cada dia que passava deixei a minha cama, fui transferido para uma outra. O enfermeiro de serviço Valadares Pereira, ao ver a minha situação, fez o pedido à messe dos oficiais a sopa, mesmo assim o meu estado de saúde piorava quarenta e dois de febre, já sentia dificuldades em respirar, apareceu na enfermaria o furriel enfermeiro, ao ver o meu estado de saúde, comunicou para Vila Cabral, no dia seguinte ao amanhecer, já se encontrava um pequeno avião, aterrar na pista afim de ser feita a minha evacuação, para o hospital do Setor "A". Fui conduzido numa auto maca, até ao avião, em pouco tempo eu já sentia um ar, um pouco fresco pois estava aterrar no aeroporto, já se encontrava uma ambulância, estacionada à minha espera para me conduzir à urgência. Fui atendido por um médico, Tenente Coronel que de imediato chamou um dos enfermeiros de serviço, me injetou um litro de soro. O médico disse ao enfermeiro que eu estava pronto para o caixote, fiquei com baixa hospitalar dezassete dias levei na totalidade dezassete litros de soro. Foi assim que naquela unidade hospitalar, que eu sentia os helicópteros da força aérea, resfolegante transportando soldados feridos e outros moribundos do campo da batalha. O médico caminhou com os seus elementos de enfermagem até à minha cama, examinou-me e disse que eu já me encontrava, em boa saúde para regressar, ao meu aquartelamento. Ordens do senhor doutor, levantei-me da cama, com um certo agastamento vesti a minha farda, sem mais delongas não disse nada medi a minha estrutura de cima a baixo, de forma quase impercetível, abandonei o hospital, segui para o interior do aquartelamento de Vila Cabral, esperando a saída de uma coluna militar, para me levar de regresso ao inferno do Lunho.

Texto de Bernardino Peixoto Soldado Corneteiro 017516/72.                                 

quarta-feira, março 02, 2022

Chegada da Companhia de Artilharia 72 60 ao LUNHO 20 de março 1974:

O 1.º Cabo Clarim João Pinto funcionário do depósito de géneros do Lunho acompanhado pelo seu Comandante de Companhia Capitão Mil.º Salavisa que renderam a C.Caç.41 41 os Gaviões no dia 20 de Março de 1974:





 Aquele inesquecível, dia 19 do  mês de Março de 1974: todos nós madrugamos, se calhar não dormimos, convenientemente e, mal despontou o sol, que no Lunho nascia bem cedo, fomos saindo da caserna com a certeza mais que certa, de que a fuga daquele purgatório estava por dias. Nunca por então tantas sentinelas, mirando a picada. todos olhávamos para o horizonte, com impaciência, perscrutando a celeste direção, que sabíamos ser aquela de onde surgiria uma coluna de viaturas, carregando aqueles, que tomariam de então os nossos lugares naquela terra esquecidas do fim do mundo. Foi uma longa espera, que a impaciência se encarregou, de prolongar ainda mais. Ansiedade foi crescendo à medida que o tempo passava e a coluna tardava. Para o grande momento, até que soou o primeiro alarme. O ponto negro, já visível no horizonte, foi agradecendo à medida,  até se tornar bem nítida a silhueta familiar da coluna que chegou no meio de uma nuvem de pó, evoluindo até se imobilizar, no aquartelamento do Lunho. Um burburinho expectante, fazia descer aqueles checas acabados de chegar, das viaturas, uma gritaria esfusiante, tomou ao mesmo tempo que cada um se esforçava, por parecer, o mais alucinado possível num misto  de loucura e contentamento.  alguns com ar mais infeliz do mundo, olhando em volta sem saber para onde se dirigir, iam sendo guiados quase empurrados, bombardeados por explicações atabalhoadas vindas de todo o lado. toda a gente ia contando, indicando, descrevendo, pintando, o que era as matas do Lunho onde ficava a Miandica, e as tarefas mais difíceis que iam ter de enfrentar.

Texto de Bernardino Peixoto Soldado Corneteiro 017516/72:        

terça-feira, março 01, 2022

Enfermaria do LUNHO:
















1.º Cabo Enfermeiro

Valadares Pereira:
                 Enfermaria do Lunho:                              1972 a 1974:
Nesta enfermaria, qualquer foco de infeção, e pequenas feridas de um dia para o outro, qualquer erupção cutânea, e o pó de talco antimicótico, aplicado nas dobras da pele fazia desaparecer as comichões, e irritações, que a humidade sudorifica agravava. A medicina preventiva era a preocupação do furriel enfermeiro. todos os dias ao almoço o enfermeiro de serviço, dispunha junto ao prato de cada um, dois ou três comprimidos: O vermelhinho, que visava compensar as insuficiências vitaminas, e minerais da alimentação, pobre e sem sabor; o comprimido branquinho, que continha a imprescindível, resoquina contra o paludismo; e mais um outro que não me lembro para quê? até havia a dose cavalar, de Vitamina era injetável, que se dizia fornecer tudo, o que o organismo, precisava. Pelo menos o Palúdico, na sua permanente mania das doenças e fraquezas, era cliente assíduo. Mas a verdade seja dita,  a grande preocupação do nosso escasso e improvisado corpo clinico centrava-se no combate ao paludismo  e à terrível doença do sono. A luta contra o paludismo, era diária através de medicação preventiva. Só em caso de contágio, quando a febre subia aos quarenta graus, se justificava a via endovenosa com a injeção de doses cavalares, de resoquina. Já a doença do sono exigia a inoculação periódica de uma vacina que era pressuposto, imunizar-nos contra uma ameaça invisível. Por mim e creio que para quase todos, mais picadela menos picadela, já não fazia diferença. Há muito que estávamos habituados, a essa rotina tanto mais que se preferia isso , ao desconforto e à perigosidade da doença. Fazia-me me ver, estando assim seria mais doloroso, para além de transformar uma simples picada em algo complexo. O enfermeiro Valadares Pereira perdeu a compostura: Acalma-te lá porra! pensa em gajas! disse brincando , baixei os meus calções, estiquei-me num banco corrido, mal senti o contacto frio do algodão que desinfetava a zona, preparou a agulha como de costume, separada da seringa, e num movimento brusco, procurando aliviar o meu tormento, deu-me uma pequena palmada na nádega nua, conseguiu  esperando conseguir, num golpe violento espetou a agulha, como uma estocada em um touro bravo. Encaixou a seringa e começou a empurrar o liquido obrigando a penetrar, naquela fortaleza de músculos. levantei a cabeça, cerrei os dentes, num verdadeiro esgar de dor, aguentei até ao fim, porra gostas de sofrer? Desabafou o enfermeiro, finalmente sacou a agulha, num gesto brusco ao mesmo tempo esfregava o algodão, emudecido na nádega repentinamente descontraída. Não percebes que assim é que dói mesmo? Mas eu não queria saber disso. Levantei-me puxei os calções, e enquanto afivelava o cinto, balbuciei num suspiro  diz o enfermeiro pronto já está, afastei-me a coxear, esfregando o rabo, à procura de alivio para o ardor que sentia.

Texto de Bernardino Peixoto Soldado Corneteiro 017516/72. 

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