domingo, janeiro 02, 2022

Guerra do Ultramar Niassa Lunho Moçambique 1972 a 1974.



 1.º 

A minha situação no Lunho Moçambique, para mim foi um choque muito grande  eu e os meus camaradas da companhia, eramos indestrutíveis. Com 21 anos de idade nos apercebemos do perigo, mas nada nos acontecia a nós houve soldados que tombaram, mas não fui eu. Sabia que estar em Moçambique no Lunho, não era um passeio no parque, mas os meus 21 anos me deixaram transformar, quase numa aventura. Eu era um miúdo oriundo de Aveleda Braga, depois de uma pequena freguesia do conselho  da Maia, qual era a experiência que eu tinha de selva, ou de guerra, ou de qualquer coisa do género? Absolutamente nenhuma. O Lunho era um local desconhecido para mim, a logística era muito degradada umas casernas construídas em chapas de zinco todas furadas dos  projeteis  das armas dos guerrilheiros da Frelimo. Quando saía para uma operação a minha alimentação era me atribuída a dita ração de combate, alimento composto por latas de sardinha de conserva e atum,  eu ia sobrevivendo com alguma fruta que ia apanhando, no mato. Um certo dia  fui escalado para mais uma rotineira operação para o mato, caminhando pelo capim no inicio enchia o cantil em poças de água,  os rios por onde passava estavam totalmente secos, Já no regresso ao aquartelamento do Lunho ao meio da tarde, o céu ficou muito escuro, via-se os relâmpagos a cruzarem-se no ar, e ao mesmo tempo rebentavam no solo,   pairou sobre nós um grande diluvio, com várias trovoadas, ventos fortes que varriam as arvores e tudo que se encontrava  na frente, tivemos que nos abrigar com o ponche debaixo das arvores mais fortes para não sermos atingidos pelos ventos.  A tempestade se afastava, foi nos ordenado que teríamos de seguir a marcha, ao  encontrar o rio Lunho, para atravessar para a outra margem, foi necessário utilizar uma catana, para derrubar uma árvore afim de fazermos a travessia para a outra margem, abraçados à mesma. No Lunho com a época das chuvas torrenciais, e secas prolongada, onde a água tinha por vezes mais valor do que o ouro. As vastas áreas em que se desenrolaram, as operações estava infestadas, de doenças terríveis e marcadas, pelos ataques permanente por todo o tipo de animais e enxames de abelhas, formigas e o Feijão macaco: A separação prolongada, e dolorosa da minha namorada, do ambiente doméstico e da terra, fez da escrita uma prática de sobrevivência!  O afastamento de casa, e a distância que se encontravam as famílias pôs em movimento as funções da correspondência, fazendo das cartas, e aerogramas, o refugio privilegiado, do sentimento  da saudade, e da autenticidade da mensagem, para quem dela era digno. A norma aponta para o envio de uma missiva diária  por soldados, sem contar com os muitos populares bilhetes-postais, para sobreviver na frente da guerra, escrevia compulsivamente. 

        Nesta cozinha também comi arroz com caganitas de rato e uma salsicha, comi carne de vaca ou de burro que alguém tinha rejeitado. O vinho da velha cepa não chegava a estas paragens, chegava sim uns barris  cheios de água do Lago do Niassa, com um pouco de tinta vermelha, e outros cheios de vinagre. Mesmo assim o vinagre e a água colorida, era racionalmente servido por um elemento da secção da cozinha  com uma lata de cerveja cortada pelo meio. A sopa era confecionada com água, Feijão preto, arroz, e couves da machamba, que era boa para alimentar «porcos». O zé soldado diariamente, fazia uma visita à enfermaria para lhes ser administrada um concentrado de comprimidos, e injeções cavalares de vitamina, nas veias. Os protagonistas era um problema, sem por evidencia que estavam envolvidos, num drama de todos nós seres humanos. estavam focados na guerra, e nos mantimentos que pertenciam a todos nós soldados, que  tínhamos direito, muitas vezes eram desviados, pelos funcionários da cozinha, A rede funcionava durante vinte e quatro horas, incluindo a hora das refeições, passei momentos de muita expectativa, entre o viver, e o parecer. Neste aglomerado de latas e canas de bambu,  sofri a mágoa, e a ausência dos meus  familiares. A contextualização politica do  nosso 1.º sargento Bizarro e o 2.º Sargento Cruz, este sempre aparecia diariamente, a passar a ronda à cozinha,  isto era uma guerra feita de pessoas, comuns com todos os condicionalismos como, eramos apenas uma simples companhia Independente.  A alimentação deveria ser igual para todos os elementos deste  grupo bélico, contudo eramos de carne e osso e as divisas ou galões, pouco nos deveria dizer.   Esta cozinha tinha dependurado num dos barrotes, um ferro que fazia de sineta para chamar todos nós que era hora das refeições. Os componentes que faziam parte desta cozinha esses também eram os melhores do Lunho, faltava-lhes apenas o casaco branco, e as boas maneiras de todo o empregado que se batia à gorja. No Lunho o pessoal sujeito à alimentação que se verificava, o 1.º cabo cozinheiro desviava da cozinha, a melhor carne, e o vinho da velha cepa, que era destinada para todos nós, o empregado do depósito de géneros, também entrava nessas andanças.  Um dia 1.º  cabo cozinheiro responsável pela cozinha,  ficou surpreendido e incomodado pela minha presença, quando os fui encontrar,  dentro da sua caserna. Eu vi com os meus olhos, um banquete com alimentos desviados da cozinha. Convidava os amigos mais próximos, e aqueles com quem simpatizava, isso era uma concordância. O nosso comandante, oficiais e sargentos nada fazia, para acabar com os petiscos roubados, ao zé soldado que ali habitavam naquele buraco do Lunho. Eu era de carne e osso e vivia como eles, naquele isolamento.
Para completar e dado que  o jantar para quem era praça, era servido bastante cedo, porque faltavam  condições para ser servido com luz artificial, necessitando de aproveitar a luz solar. O meio era tão pequeno que nada se fez sem pensar na mínima coisa, embora insignificante sem que todos os componentes deste grupo belicoso  o soubesse!!!!!! Existiram contudo coisas que em qualquer outra parte eram impossíveis. A comida nesta cozinha não interessava a ninguém, é claro que na guerra era obrigado pela necessidade de comer de tudo, No mato bebia água dos charcos com um comprimido à mistura.  
No Lunho Moçambique, nós soldados vivíamos com os ratos, as condições eram horrendas

Texto de Bernardino Peixoto Soldado Corneteiro 017516/72:         
 


 

quarta-feira, novembro 24, 2021



 Durante tanto tempo que durou a nossa estadia por terra de  Moçambique, um dos desejos mais frequentes, que alimentava o sonho da rapaziada, era sem qualquer margem para duvidas o momento de que comprida a comissão, se regressaria a casa. Enquanto durou a nossa via- sacra, pelas terras inóspitas e picadas de Moçambique, isso era algo que parecia muito distante quase inacessível. Mas aos poucos naquela exasperante lentidão, espinhosa teimavam em empatar e porque o tempo não para, os dias foram sucedendo às noites, os meses preenchendo-se e o tempo passando até àquele dia memorável, em que nos tiram dali, despejando-nos no aprazível sossego de Malema, È verdade que nos sentimos verdadeiramente, compensados dos tratos sofridos no meio das picadas nas terras- do- fim-do mundo. contudo, não obstante este episódio da Companhia de Caçadores 41 41 os Gaviões. Todos se lembrarão que por alturas do mês de setembro de 1974 correu a celebre noticia, de que que a saída de Malema, seria no dia 30 de Setembro. Nós estávamos na expetativa quando por ali chega-se os que nos vinham render. Aguardando o embarque na estação de Malema, estávamos livres da porta  de armas, postos de sentinela, das operações e das exigências militares, a coisa esmoreceu um pouco. Seguimos num comboio até Nampula aguardando embarque para a cidade da Beira onde desembarcamos à nossa chegada. Assim sendo aproveitou-se tanto quanto possível o afrouxar da disciplina, usufruindo de tudo o que a cidade tinha  para oferecer. Alguns mudaram-se para  pensões, para facilitar as pernoitas e comer bem, por menos dinheiro calcorreavam-se as explanadas, bares, e compensaram-se as privações passadas, até com cada vez maior acerto, A última noite passada em Nampula, aquilo que começou a ser um simples jantar, num qualquer restaurante, virou noite de farra. esvaziaram-se garrafas, misturou-se cerveja, entendeu-se que a ultima noite seria de desbunda. ultimo dinheiro em  notas Moçambicanas e até moedas, creio que se foram. Retenho na memória o desembarque em Lisboa, no aeroporto de Figo Maduro no dia 15 de outubro de 1974  noite fria e húmida, que contrastava o cacimbo de Moçambique. Despedi-me definitivamente  ali mesmo da minha farda, quase sem sem me despedir dos meus camaradas . Mas olhando assim à distância do tempo ainda me interrogo como foi possível ali viver durante tanto tempo tão longe de tudo o que se assemelha-se da civilização. 
O sistema cógnito da beleza selvagem, porem feérica e de personalidade forte, tiveram em mim um efeito devastador. Gravadas pela força dos sentimentos, permanecem vivas e bem arrumadinhas nos ficheiros das memórias, cujo gavetas vou abrindo aqui e ali a cada das lembranças que vão alimentando estes meus escritos. Não.......não é saudosismo, apenas recordações, que de tão marcantes, não consigo apagar e já lá vão cinquenta anos.            .


Texto de Bernardino Peixoto Soldado Corneteiro 017516/72               

C.CAC.4141 os gaviões : A PRIMEIRA SEMANA DA MINHA RECRUTA: EM VILA REAL D...

C.CAC.4141 os gaviões : A PRIMEIRA SEMANA DA MINHA RECRUTA: EM VILA REAL D...: Fui apurado para todo o serviço militar obrigatório, a partir desse dia estava às ordens do exército de Portugal, os dias iam passando, um...