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Antigo Combatente do Ultramar Moçambique
Radiografia do Lunho (O BURACO)
Sentado a uma tosca mesa, concordante máxima com o meu cógito, irei expor não o que a minha imaginação forjar, mas sim aquilo que os meus olhos têm visto, e bem e hão-de continuar a ver Entretanto se me permitem irei sacar de um FN para queimar, enquanto reproduzo graficamente o que venho a presenciar. O cigarro começa a desaparecer deixando descontraidamente, subir o fumo, em virtude de um Ronsom da picada (oferta do Movimento Nacional Feminino) o haver inflamado numa das extremidades. O cenário é naturalmente, e por ninguém contestado o valor da primeira grandeza numa representação teatral.
Existia algures a Noroeste do estado, que ultimamente era designado por este nome, de Moçambique um foco de civilização, onde se conseguia evitar a morte. Neste aglomerado de latas e canas de bambu, vivia gente nobre e com altos ideais. Nestes postos de sentinela perderam muitas noites homens armados como caçadores à espera de caça. Nestes subterrâneos passaram-se momentos de autêntica expectativa entre o viver e o parecer. Existiam contudo coisas que em qualquer outra parte eram impossíveis. Pude ver uma capela sem padre, que deixava circular livremente a luz e o ar sobre umas chapas de zinco e por entre umas colunas de madeira que sustentava o teto zincado. Via-se uma cruz na frente deste local destinado à oração, mas esquecido para tal fim. Era pois este o indicativo e só de capela ou algo análogo. Dentro destas e debaixo destas folhas metálicas encontravam-se ao fundo umas cruzes imperfeitas com Cristos crucificados, uma santa aparecida na Miandica de terço a pender das mãos, ar triste talvez por se encontrar só no meio de um ambiente bélico e sem estatutos, uma chapa em cima de um bidão servindo de, mesa para a celebração do Santo Oficio.O clima atmosférico era quente o do ambiente era frigido. A superfície cutânea destes soldados transpirava quer suor frio, quer suor quente.....suor. Nos dias de calmaria os Africanos que constituíam o grupo de integração n.º 132, serviam-se da casa da Cruz de madeira para dormirem a sesta e trocarem entre si impressões que muita gente não compreendia. O local era dos mais frescos possíveis de trepar e como tal era bastante convidativo. Faltava apenas o rapaz de casaco branco e de bandeja na mão a dizer " faz o obséquio de pedir" Será como o café depois das refeições se reúnem os amigos não só para engolir café, mas também para dizer e desdizer deste ou da quele. Neste lar sem união, comi carne de vaca ou de burro que alguém tinha rejeitado. Eramos visitados duas vezes por semana. Tinamos direito apenas 200 kg de víveres portanto 400 kg para serem consumidos em sete dias. A zona não era explorada mas como tal só era possível tragar o que nos levavam. Bebia-se água férrea quando não havia avaria na bomba ou no motor que a fazia mover, ou ainda quando faltava o combustível necessário para a movimentação da máquina. bebia-se esta mesma água a temperaturas que fariam pelar leitões, quando as geleira não funcionavam coisa que frequentemente se verificava. O vinho da velha cepa não chegava a estas paragens, chegava sim uns barris de água do Lago do Niassa com um pouco de tinta vermelha e outros cheios de vinagre. Mesmo assim o vinagre e a água colorida, era racionalmente servidos por um elemento da secção da cozinha, com uma lata de cerveja cortada pelo meio. Este vaso, definitivamente provisório, não tinha asa ou qualquer coisa do género por onde se lhe pegue. Como ia dizendo o homem com as mãos muito sebentas, enfia um dedo ou os dedos dentro do recipiente e ai lavando assim as mãos com o liquido que vais distribuindo aos soldados, que em fila ordenadamente se aproximam. Pude beber ainda à pecúnia, a cerveja com carimbo de isenção, mas vendida a preço corrente, quando a cerveja falhava coisa habitual, bebia coca cola, e quando esta falhava bebia Hispo-te, quando esta falhava bebia água, e quando esta falhava passava sede. Claro que havia mais bebidas, mas estas era a preço de consumo. Como lhes disse no introito desta pretensão a crónica, trata-se efetivamente de uma sombra de crónica e não de prosa de ficção. Precisei de ideias frescas para bem poder reproduzir o que se passava e o que era o Lunho. Sim porque a inspiração era muito fraca naquele reino de escuridão e solidão que habitava um bairro de latas, cercado de matagais nunca dantes explorado. Temo francamente que o "engenho e a arte" me faltem para fazer compreender a realidade sem fantasias, pois por mais que exagere, talvez se não consiga incutir nos que me leem a pura realidade. Reunido o Senado, reunião diária, para discutir do que foi e do que seria o dia de amanhã, falava-se superficialmente da próxima operação dom duração de oito dias. O chefe designava, por escala os graduados contemplados e convidava a ficarem após da reunião para discutirem sobre o que haveriam a fazer e as medidas a tomar em relação ao dito passeio. Quais os objetivos na nomadização? São vários: tratava-se de procurar o inimigo nas bases de caráter ambulante dado ás constantes visitas que as nossas tropas lhe faziam. O objetivo seria procurar, mas há vezes em que se tentava evitar o encontro. Aqui perto existia uma base do inimigo a quem lhe chamavam a Mepoche e segundo diziam, que ninguém lá se conseguia penetrar. O terreno era ravinado e o europeu não conseguia penetrar, dado que os trilhos se encontravam armadilhados e fora dos mesmos era impossível a progressão. Depois de falar a cerca da operação, pensou-se que iriamos arrasar a dita Mepoche, capturar o possível em vez de matar, trazer armas e bens que lhes pertençam. Claro que dentro do aquartelamento as operações eram cheias de êxitos, mas quando se aproximavam as Kalakenikovs acompanhadas pelos morteiros Oitenta e dois se começavam a ouvir. Depois de determinado numero de homens o pessoal que tomaram parte da operação, ordena-se a formarem na parada, para nos darem a conhecer o que iriamos fazer no próximo dia e quais os cuidados a ter no mato. Em seguida foram distribuídas as rações de combate, alimento que nos foi fornecido para nos manter em pé durante os dias que tínhamos de dormir sob o firmamento e com as costas ao relento. No primeiro dia o pessoal ainda vai fresco e como tal resistíamos às intempéries. No segundo dia já começava a haver um ou outro que precisava de comprimidos ou injeções. Tudo isto era aplicado em doses cavalares, fazendo andar um corpo de pé embora o organismo se vinha a ressentir num advir mais próximo ou mais remoto. No terceiro dia havia um soldado mais frágil, que não aguentava, começa a ser maco-transportado por camaradas, que de dois paus um pano de tenda e algumas fibras de árvores fizeram o engenho Tudo era prático nesta vida virgiliana, desde a construção de uma maca à higiene que nem existia. No quarto dia havia quase imprescindivelmente, uma telefonadela lançando um SOS para um dos componentes da força ambulante ser evacuado dado a doença súbita. Habitualmente verificava-se que o paludismo misturado com fraqueza que atacava estes corpos errantes. No quinto dia logo pela manhã vem um hélio acompanhado pelo respetivo bombardeiro, para transportar para o hospital setorial o enfermo, pois no dia anterior a guerra havia fechado pelas dezassete horas a FAP. Destas evacuações urgentes, efetuadas após quase vinte e quatro horas após o lançamento do SOS podiam resultar consequências deveras desagradáveis. A dama de companhia do hélio vinha para o que desse e viesse e se necessário fosse, este começava a fazer a sua "psico" com material bélico. Contudo também eramos abastecidos ao quinto dia. Mas antes de continuar, visto que já estou a perder o norte, vou dar efeito retroativo ao amalgamado que venho a reproduzindo. A despedida dos rapazes que faziam parte da operação, era análoga aquelas despedidas que tinham no lugar de Alcântara cais da Rocha Ali havia lágrimas que rebentavam, aqui havia amargura com lágrimas que não rebentam. Os que partiam abraçavam os que ficavam para defenderem o bairro de latas, confortando e desejando uma boa estadia no mato. Parecia que partíamos para muito longe e que nunca mais nos iriam ver; parecia que partíamos para um jogo de vida ou de morte; parecia que partíamos para a morte. Aquelas caras não deixavam (as que saíam) saltar um sorriso e só não deixavam verter lágrimas porque eram homens. Estas partidas eram cena que comoviam muita gente, havia um desgaste quer fisico psíquico, difícil de avaliar, quer no pessoal que partia, quer naquele que que ficava. Muitos deles refugiavam-se no tabaco, outros no álcool haviam muitos que não havia fumado ou ingerido bebidas alcoólicas em excesso, e começavam a partir deste isolamento a viciar-se. Os que ficavam no aquartelamento, tiravam fotografias aos que partiam para o mato, porquê? Talvez porque queriam ficar com uma recordação impressa do camarada que podia voltar inanimado ou mesmo não voltar. Sentia-me só menos desamparado, menos olvidado, mais perto da civilização mais perto do homem, quando recebia correio coisa que acontecia vulgarmente duas vezes por semana. Eram dias grandes, estes em que podia fazer leituras epistolares, embora o miserável bocado de papel não seria o melhor meio de comunhão entre as pessoas. Mas sempre era melhor que o silêncio completo, facilmente ressentido como abandono. Não sentia o calor dos lábios da minha noiva e esquecia enquanto lia que estava em zona de 100%.
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