segunda-feira, março 07, 2016

Malema Entre os Rios Moçambique 1974,




Povoação de Malema Moçambique




O ADEUS AO LUNHO NO DIA 23 DE MARÇO DE 1974!!! E O REGRESSO À CIDADE:

O facto de não reter pormenores, convenci-me que talvez estupidamente ter recordado o dia, em que montados nas viaturas, saímos  do Lunho iniciamos aquela empolgante  aventura, que foi a grande viagem desde as terras do fim do mundo, até ao paraíso de que agora nos despedíamos. Bem paraíso   apenas por comparação com o inferno que nos serviu de morada, nos primeiros dezassete longos meses,  o ermo que ninguém ficou com saudades. Com tudo admitia que se um dia eu volta-se àquele quadrado delimitado, por uma ferrugenta  cerca de arame farpado. A guerra seguia em frente, naquela sistemática substituição de companhias uns a chegar outros a partir, numa permanente adaptação a novos lugares e novas missões. Para os recéns, chegados checas, da Companhia de Artilharia 72 60 tiveram a acalmia necessária, para lamber as feridas da alma!!! para nós velhinhos da 41 41 os Gaviões, foi o adeus definitivo aos postos de sentinela, à ponte do Lunho,  ao mato, ás operações, à Miandica, e às picadas.

A nossa viagem até Malema-Entre- os- Rios foi um pouco longa, seguimos pela picada até Metangula onde já se encontrava uma lancha da marinha, à nossa espera para nos transportar até Meponda. Depois seguimos numa coluna até à pequena cidade de Malema. Mas esta era a ultima viagem materializava  o regresso à civilização, ao bulício da cidade, ao trânsito contudo  o que isso tem de bom e de mau. Para mim contudo, representava finalmente a fuga às agruras, e aos tratos de polé infligidos, por uma natureza hostil. Agora sim, a mata ficava para trás e a guerra, que sentia ir desaparecendo da minha vida, no sossego que chegara definitivamente ao fim. Mas para mim que cheguei ao fim daquela missão, representava o limiar da civilização, e o recomeço da minha vida que ficara parada no tempo. 
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Aqui em Malema no dia da rendição, decorreu sem grandes alaridos sem pressas e sem ansiedades. Não houve praxes é coisa que só se faz aos checas, e nada havia para contar que interessasse a quem vinha, preencher  de histórias rocambolescas. A passagem do testemunho foi feita naturalmente, por gente já experiente, e conhecedora dos correspondentes preceitos, protocolares e, em boa verdade. Abraços e apertos de mãos  efusivos,  e um acenar de até sempre. Compuseram uma despedida muito distinta do  nosso  adeus a Malema que no dia 30 de setembro, deixamos para trás. Como lá deixei muitos amigos, diferentes mas igualmente amigos, mas todos tínhamos pressa de fugir sem olhar para trás. Era uma pequena cidade cheia de gente, que nos tratou sempre bem, não era propriamente um local de que se quisesse a distancia. Partimos felizes, porque isso apenas significava que estava perto do regresso a casa; a minha passagem pela guerra chegara definitivamente a seu termo. Por mim aquela certeza que jamais, voltaria a calcorrear as esgotantes terras-do-fim- do- mundo trazia uma confortante, sensação de bem estar, apenas perturbada pela recordação do inacreditável, acidente que vitimou o condutor « Joaquim Serrão» na oficina mecânica do Lunho. Exatamente quando já parecia tudo certo, que os restantes regressaríamos ilesos, o destino decidiu, fazer-nos pagar  a ousadia de termos conseguido escapar à má sorte, como se o asar nos levou o nosso melhor condutor, « Francisco Santos» não tivesse sido já paga suficiente?. Quando a minha peluda chegou, a minha vida mudou radicalmente. De momento em quase tudo  eu era condicionado por uma disciplina militar ditada por uma enormidade, de obrigações e regras de conduta, até então compridas, quase por inércia qual o reflexo condicionado, de quem se teve de habituar a uma disciplina que não admitia contestação, passou-se  a um estado em que cada um fazia o que mais lhe dava na gana. È verdade a peluda estava a poucos dias de vista e isso levava a comportamentos pouco consentâneos, com as exigências militares,  reduzindo os regulamentos, a uma mera insignificância. Tenho ainda  a longínqua recordação, do alivio que experimentei  perante a iminência do despir definitivo da farda em simultâneo com o formal depor das armas materializado na entrega, nas arrecadações, que dois anos  antes nos foram entregue, e que então assumi serem sinais óbvios  em que estava ali de passagem a caminho da guerra. Naquela fase a grande tarefa da minha Companhia, resumia-se em arrumar a casa. Felizmente que tínhamos o nosso primeiro Sargento Bizarro de eleição, um homem conhecedor daquele mundo, complexo. Em Malema enchi os olhos, de mulheres lindas, e singelamente sedutoras.

Texto de Bernardino Peixoto  Soldado Corneteiro 017516/72.                     

8 comentários:

  1. Bonita foto. O que será isto hoje?....

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  2. Malema é uma cidade pequena mas colorida aqui me senti bem onde as luzes policromas da civilização significaram milhares de quilômetros entre mim o Niassa o Lunho a guerra o mato o capim o esforço e as privações.
    Mas tal foi verdade eu fiquei por lá durante 17 longos meses onde o sol era mais violento e o céu incomparável mais azul.
    Mas os ventos por acaso me empurraram para cá e aqui estive até ter terminado a minha comissão.
    Nesta pequena cidade eu percorri longas avenidas sentava-me uns momentos numa explanada espreitando as montras nos bazares para a fruta de orientação. As avenidas eram imensas e luminosas existiam pessoas de várias raças e cores contava que alguém recem-chegado de remotas paragens tinha de ir apanhar os olhos a dez metros de distância o que praticamente toda a gente fazia. E já agora vou falar deste exemplar da fauna circunvizinha quando encontrava um tipo ingrouviado de nariz no ar e kodake na mão em riste esse era um "buef".
    Felizmente que eles não vinham sozinhos traziam sempre à trela aliás bastante froxa o indispensável complemento do sexo oposto.
    Sentime bem nesta pequena cidade onde existia um clube uma estação de caminhos de ferro várias pensões aldeamento com muitas palhotas machambas a administração e uma igreja com padre onde se praticava o Santo Oficio.
    Nesta pequena cidade viviam casais do Continente homens que trabalhavam na linha ferroviária.
    Pois bem nesse clube e nas esplanadas quando havia uma espécie de um elemento decorativo tão agradável aos nossos olhos especialmente quando usavam e abusavam da mini-saia então sim? Era completa felicidade mas se elas se distraiam com a reduzida mini-saia o que muitas vezes acontecia para provocar estes jovens militares que tinham acabado de chegar do mato onde estiveram isolados e privados do parecer.
    O pobre cidadão arriscava-se a sofrer de estrabismo erremediavel para o resto da vida.
    Nesta grandeza existiam mulheres que nunca tinham pegado num cigarro e nunca tinha bebido qualquer espécie de álcool sentavam-se na esplanada do clube vestidas de mini-saia reduzida queimando cigarro atrás de cigarro bebendo álcool sem regra.Todos nós tivemos o privilégio de conhecer as princesas do Indico.

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  3. 23 de Junho de 1974:
    Depois de um dia de trabalho na secretaria de Malema como era noite de S.João me desloquei até ao clube onde encontrei uma vista panorâmica os civis já preparando uma fogueira para prepararem a noite uma festa que nós no Lunho era feita com tiros de G3.De repente aparece uma viatura nos recolher e nos levar para o aquartelamento para nos equipar com o material de guerra uma povoação estava a ser atacada pelos guerrilheiros da FRELIMO com armas automáticas e morteiro 62.
    Lá fomos em direção à povoação quando lá chegamos aquelas cabeças de cabelo encarapinhado já se tinham posto em fuga.Foi feito o reconhecimento já estávamos habituados a enfrentar grandes palcos de guerra nada nos metia medo.Pernoitamos na povoação a fazer patrulhamentos e não conseguimos ver o rasto dos guerrilheiros. O dia amanheceu e o pessoal regressou ao aquartelamento e lá se foi a noite de S.João.
    O tempo ia passando e só nos faltavam dois meses para o pessoal regressar à Metrópole fomos surpreendidos pelos nossos camaradas africanos que nos acompanharam no Lunho se revoltaram contra nós pegaram nas suas armas G3 e comessaram a disparar dentro das casernas dizendo que nos iam matar a todos nesse momento eu tinha ido à enfermaria ao ouvir os disparos das G3 me escondi debaixo de uma cama.A nossa sorte foi que o segundo comandante da companhia Curto Ribeiro e o furriel Serafim Afonso estava a entrar no quartel ao ver a terrível situação foram e conseguiram acalmar aqueles rebeldes de cabelo encarapinhado e foram desarmados. Pensei que seria o nosso fim eles não estavam a encarar de frente o nosso abandono.Esta situação por mais estúpida foi portadora do nosso sofrimento

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  4. Um certo domingo o dia tinha amanhecido o astro rei já brilhava como uma bola de fogo quando o condutor auto Antonio Manuel Coelho Ferreira se derigiu à minha caserna a mando do comandante da companhia para eu vestir o meu camuflado e pegar na minha arma G3 colocar as cartoxeiras à cinta para fazer um serviço que o nosso comandante tinha ordenado.Foi nos fornecidas (ração) de combate para o almoço. Entrei para uma Mercedes com caixa o meu camarada condutor auto pôs a viatura a funcionar e lá fomos deixando o quartel para trás atravessei a cidade e entramos numa picada de terra batida com bastantes árvores.Já percorridos imensos quilômetros avistei ao cimo da picada uma pequena capela pintada de branco onde tinham acabado de contrair o matrimônio vinte e nove mulheres de raça negra.Sai da viatura comecei a organizar o embarque daquelas jovens vestidas de branco.O condutor pôs a viatura em andamento de regresso ao local onde o palco já estava montado para serem recebidas pelos seus maridos que já se encontravam no local.Chegou a hora do nosso almoço o condutor parou a viatura no meio da picada onde o astro rei queimava as jovens noivas permaneceram em cima da carroçaria da Mercedes enquanto almoçava o merecido almoço debaixo de uma árvore. A algazarra daquelas recém casadas que eu me derigi junto da viatura e pedi para que tivem calma que estávamos de partida.O meu camarada condutor pós a viatura em movimento a viatura seguia a grande velocidade pela picada percorridos vários quilômetros avistei novamente a linda cidade de Malema.Depois de atravessar a cidade encontrei mais uma longa picada essa que nos levara ao local onde se encontrava montado o palco para a festa.Depois de percorridos muitos quilômetros encontrei um pequeno aldeamento rodeado de palhotas se encontrava à nossa espera um homem negro de cabelo encarapinhado já meios brancos esse homem era o chefe da tribo era o régulo que nos recebeu de braços abertos.Foi feito o desembarque e fizemos as despedidas para regressar ao nosso quartel mas o chefe da tribo nos convidou para assistir à festa daquelas jovens recém casadas acabadas de chegar.Fui bem recebido pela população comiam dançavam e eu a um canto do palco da festa admirando a alegria e a boa deposição daquele povo Africano.Comi carne de borrego de Frango assado na brasa acompanhado com o bom vinho da velha cepa e a sempre fresca a cerveja Laurentina. Na hora da despedida fomos saudados por aquele povo que nunca tinham visto um soldado de uniforme.De regresso à nossa unidade o chefe da tribo nos desejou uma boa viagem de regresso. Com a viatura em andamento e percorridos vários quilômetros na picada viajava apeados um casal de raça negra que nos pediram boleia o meu camarada condutor colocou o freio à Mercedes parou saiu da viatura e os colocou na carroçaria. Percorridos vários quilômetros nos deram sinal que tinham chegado ao destino.O casal ao abandonar a viatura nos convidou para irmos com eles à machamba nos ofereceram um bom galo a cada um tínhamos o jantar garantido.

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  5. Sem querer alongar mais desejo aqui referir a titulo exemplificativo o quanto estava a ser feito nesta pequena e linda cidade de Malema.
    Nesta cidade faleceu vitima de acidente o soldado condutor auto Francisco S.Santos no dia 26 de Junho de 1974 transportava na viatura o comandante da companhia e o alferes Carvalho Duarte que tiveram ferimentos ligeiros.Ao saber da triste noticia fiquei muito triste esse soldado que me transportava sempre que eu tinha necessidade de sair para ir à estação ferroviária buscar o saco do correio.Fiquei triste com a perda deste meu camarada que era o melhor condutor da companhia.

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  7. A C.CAÇ.4141 OS GAVIÕES ficou com a sede de Entre Rios-Malema e lá permaneceu apenas um grupo de combate outro foi destacado para MUTUÁLI e dois grupos de combate foram reforçar a C.CAÇ.4242 no destacamento de BELÉM.
    A atividade operacional de MALEMA-ENTRE OS RIOS era constituída por patrulhamentos de APSICOLÓGICA.

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  8. Nesta pequena e colorida cidade a 30 de Setembro de 1974 chegou o fim da minha comissão tive que deixar para trás tudo de bom que existia senti uma enorme saudade. Não pude planificar aqui uma coisa em três dimensões nem sempre pude ser eloquente especialmente nestas trocas de impressões tão demoradas.Eu tinha a plena consciência que alguém do outro lado do Oceano Indico se encontrava uma jovem que tinha aceitado antes de eu partir para a guerra um compromisso de namoro. Assuntos mais pertinentes e absolutamente inofensivos o que não foi nada fácil.Suponho que ficaram elucidados os meus caros amigos que eu deixei para trás e nunca mais tive qualquer contacto com eles foi muito difícil a despedida mas eu não tinha outra alternativa tinha que viajar com os meus camaradas para a Metrópole.
    O dia 30 de Setembro chegou e eu tive de preparar uma pequena bagagem e seguir para a estação dos caminhos de ferro de Malema para embarcar num comboio que o destino era Nampula.Olhei para trás com as lágrimas a correr pelos meus olhos despedi-me da linda cidade onde passei momentos bons deixei para trás os meus camaradas de guerra de raça negra e aquele povo Moçambicano. Subi para o interior do comboio encostei-me junto de uma janela relancei um ultimo olhar para a linda cidade e num ímpeto gritei interiormente desejando uma boa sorte.O comboio arrancou a grande velocidade e em pouco tempo vi a cidade de Nampula à vista.Poucos dias depois viajei num avião até à mesma cidade onde tinha desembarcado a 13 de Novembro de 1972 cidade da Beira.Feito o desembarque já tinha outro avião para me trazer de volta para a Metrópole onde cheguei no dia 16 de Outubro de 1974 ao aeroporto de Lisboa.Ali mesmo fis o expolido ali mesmo terminei a minha (comissão)Senti uma grande alegria sabia que estava a poucas horas de abraçar os meus familiares e a minha noiva.

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Recordações da minha vida Militar.